- Mas você não tem medo de um dia se arrepender de ter ficado aí, deixando seus projetos de comunicação de lado? Se arrepender de ter deixado seu país e depois perceber que é tarde demais?
Eu perdi essa coisa de raíz há muito tempo. Então porque eu nasci no Brasil, eu devo ficar no Brasil? Não me sinto somente brasileira, muito menos americana. Me sinto parte de algo maior do que apenas um país. Pela primeira vez tentei imaginar como seria minha vida hoje se eu tivesse ficado por lá. Não há uma imagem na cabeça, não faço a menor idéia.
Acho que este ano foi transitório e de aprendizado pra mim. Aqui aprendi a ser mais positiva, mais paciente, mais prática. Aprender a se comunicar numa cultura diferente da sua é fascinante e eu não quero dizer só o idioma mas a forma de se relacionar, de entender e ser entendido, de ler as entrelinhas, de respeitar as diferenças.
A principal satisfação em ter ficado foi a possibilidade de fazer parte de uma comunidade (os burners) na qual eu me identifico muito. Hoje em dia, tenho consciência desta minha necessidade de sentir parte de um todo e ao mesmo tempo, preservar minha individualidade. Com eles, vi que aqui também há muita gente espiritual, afetiva, solidária e liberal. Me envolvi com arte, dança e trabalhos humanitários desde ajudar mendigos através de atividades até vítimas de desastre através de reconstrução. Vi a aceitação das diferenças sem rotular os outros. Aprendi a doar mais. Aprendi a melhorar a auto-estima. Vi que apontar virtudes traz muito mais resultado que apontar defeitos. Conheci mulheres fortes, independentes, seguras e que de sexo frágil não têm nada.Se eu não tivesse me envolvido com esta comunidade, provavelmente teria voltado pro Brasil. No entanto, não sei se teria a possibilidade de viver algo assim lá porque nunca conheci nada igual e no Brasil somos mais voltados para a família. E aqui estou 7 anos depois, sem ter feito dinheiro, sem carro novo ou casa mas de bem com a vida.


